“Diálogos na USP” discute novas regras para a saúde mental

 

O governo federal prepara um documento que coloca em prática uma nova política de atendimento à Saúde Mental no Brasil. Entre outros pontos, prevê a internação em Hospitais Psiquiátricos e o financiamento para a compra de máquinas de eletrochoques. Baseado em portarias e resoluções publicadas entre outubro de 2017 e agosto de 2018, a nota técnica chegou a ser divulgada no site do Ministério da Saúde.

Após receber críticas de especialistas, o texto foi retirado do ar. O Ministério afirmou que o texto ainda não está pronto. Depois de chegar à versão final, o documento ainda precisa ser aprovado pela diretoria da área e pela secretaria. Não há uma data prevista para conclusão e implementação.

O que, afinal, significa esta postura do ministério quanto à saúde mental? É um retrocesso ou um avanço? De que forma este documento poderá afetar a vida de milhões de brasileiros?

Para falar sobre Saúde Mental no Brasil, o Diálogos na USP recebeu a professora Carmita Helena Najjar Abdo, médica psiquiatra e professora da Faculdade de Medicina da USP, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, e Eduardo Tomasevicius Filho, professor do Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP, com pesquisas que envolvem, entre outros aspectos, direito civil e a pessoa com deficiência.

Carmita Abdo justificou a medida do governo federal, alegando que, atualmente, os pacientes estão vivendo em péssimas condições, sendo que muitos moram na rua. A professora complementou que “a mortalidade hoje é muito maior do que em outras épocas. Os índices de suicídio de pacientes com problemas de saúde mental aumentaram vertiginosamente nos últimos tempos”. Sendo assim, a mudança é de extrema importância e deveria ter ocorrido há muito tempo. “Nós não teríamos perdido tantas vidas e não teríamos agravado a situação de moradores de rua, de pessoas que estão presas quando deveriam estar em tratamento”, afirmou.

Eduardo Tomasevicius apontou que, desde a antiguidade, já ocorriam casos de pessoas com problemas de saúde mental. “No direito romano se denominavam de furiosos (furiosi) as pessoas que não estavam com plenas faculdades mentais”, explicou. Os primeiros tratamentos científicos surgiram apenas no século 18 e, a partir daí, “passou-se a fazer um tratamento médico, dentro das possibilidades que a tecnologia da época oferecia”.

O eletrochoque é provavelmente a parte mais polêmica das novas medidas propostas. Contudo, Carmita enfatizou que “a boa aplicação do eletrochoque é fundamental. Ele é, de fato, imprescindível em alguns casos em que o quadro é resistente e já se tentou todo tipo de tratamento e não houve nenhuma resposta”. Outro exemplo de paciente em que este tipo de tratamento é útil é no caso de esquizofrenia catatônica, no qual “a pessoa fica completamente perplexa diante do nada e não tem nenhuma reação a qualquer estímulo”. A professora também ressaltou que há uma metodologia de aplicação muito precisa. “Ninguém está pensando em castigar alguém com o eletrochoque”, declarou.

Tomasevicius relembrou que a Constituição garante o direito à saúde, e que isso inclui pacientes com problemas de Saúde Mental. “É da natureza humana socorrer alguém que está passando por necessidade ou está doente”, completou. O professor também frisou a má qualidade dos procedimentos executados nas penitenciárias: “O tratamento é cruel, não se recupera absolutamente ninguém e as pessoas saem pior do que entraram”.

Diálogos na USP tem apresentação de Marcello Rollemberg, produção da Editoria de Atualidades do Jornal da USP e da Rádio USP e trabalhos técnicos de Rafael Simões.

Fonte:

Jornal USP